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O Ordo Salutis arminiano e calvinista: um breve estudo comparativo



Por Ben Henshaw

A ordo salutis é a "ordem da salvação". Ela enfoca o processo de salvação e a ordem lógica desse processo. A principal diferença entre a ordo arminiana e a calvinista recai sobre a fé e a regeneração. Estritamente falando, a fé não faz parte da salvação na ordo arminiana, uma vez que ela é a condição que se satisfaz antes do ato salvador de Deus. Tudo o que segue a fé é salvação na ordo arminiana, enquanto na ordo calvinista a fé é – de algum modo – o resultado da salvação. O que se segue é como eu vejo a ordo arminiana comparada com a ordo calvinista, juntamente com o porquê de eu achar teologicamente problemática a ordo calvinista.

Ordo salutis arminiana:

Graça preveniente



[União com Cristo]

Justificação

Regeneração

Santificação

Glorificação


Notas sobre a ordo arminiana:

Novamente, é importante notar que, estritamente falando, a graça preveniente e a fé não são parte da salvação, mas são necessárias para a salvação. A graça preveniente torna possível uma resposta de fé, sendo que, a fé é uma condição ordenada por Deus a ser satisfeita antes d’Ele salvar. A fé é sinérgica na medida em que ela é uma resposta genuína, que se torna possível pela graça capacitadora de Deus. Tudo o que se segue (os vários aspectos da salvação) é uma obra monergística de Deus. Embora a salvação resulte da fé, a fé não é a causa da salvação. Deus causa a salvação em resposta à fé segundo a sua promessa de salvar os crentes.

Há outros aspectos ou expressões da salvação que não estão explicitamente incluídos na ordo acima. Adoção, por exemplo, provavelmente deveria estar incluída entre a regeneração e a glorificação. A regeneração incluiria o início da adoção, enquanto a glorificação incluiria o seu ponto culminante. A eleição deveria estar amarrada à união com Cristo. Portanto, nos tornaríamos os eleitos de Deus em consequência da nossa união com Cristo (o Único eleito), enquanto viríamos a participar da Sua eleição através da união e identificação com Ele. A fé nos une a Cristo (Ef 1.13) e todas as bênçãos espirituais que residem em Cristo se tornam do crente mediante a união com Ele (Ef 1.3-12).

Temporalmente, essas bênçãos se tornariam nossas simultaneamente, mas logicamente é importante colocar a justificação antes da regeneração e tudo o que se segue, uma vez que é preciso primeiro receber o perdão do pecado e tê-lo removido antes do recebimento da nova vida e obtenção da santidade (santificação). Ninguém pode ter vida enquanto está sob a condenação do pecado e da ira de Deus, pois "o salário do pecado é a morte". E ninguém pode se fazer santo à parte da justificação. Assim, enquanto permanecermos unidos a Cristo, somos purificados pelo Seu sangue e nova vida e santidade provém imediatamente dessa purificação.

A predestinação se refere ao destino pré-determinado dos crentes através da união com Cristo. Os crentes são predestinados para a adoção definitiva e conformidade à imagem de Cristo (glorificação). A predestinação não se refere à predeterminação divina de certos pecadores se tornarem crentes e finalmente serem salvos.

Ordo salutis calvinista:

Eleição/Predestinação (incondicional)

Regeneração



Justificação

Santificação

Glorificação


Notas sobre a ordo salutis calvinista:

A ordo calvinista começa com uma seleção divina incondicional de certos indivíduos para a salvação. Esta seleção divina dos que serão salvos recai sob a eleição e a predestinação. Deus, então, regenera os indivíduos pré-selecionados em tempo (geralmente após ouvirem o evangelho). A regeneração causaria uma resposta de fé. A maioria dos calvinistas diria que a resposta de fé será automática e imediata.

Neste momento as pessoas são regeneradas por Deus e então creem. Os calvinistas tendem a falar da fé como um dom incondicional e irresistível de Deus e não como uma condição para receber a salvação. A fé faz parte do pacote da salvação, pois ela surge a partir de um aspecto primário da salvação-regeneração. Os calvinistas, muitas vezes, dizem que a fé é monergística, todavia é difícil ver como a fé possa ser monergística a menos que Deus creia para o indivíduo. Contudo, a maioria dos calvinistas nega que Deus creia para a pessoa, porém, mantém que a fé é uma obra monergística incondicional de Deus, juntamente com todos os outros aspectos da salvação.

O problema com a ordo calvinista tem a ver com a prioridade da regeneração (o novo nascimento). Logicamente, o novo nascimento (regeneração – o início da vida espiritual) precede a justificação na ordo calvinista da mesma forma que precede a fé (a Bíblia é clara que a justificação é pela fé). Então, logicamente falando, temos pessoas que estão recebendo nova vida antes da justificação. Uma vez que a justificação inclui o perdão e a satisfação da ira de Deus, a ordo calvinista resulta no recebimento de vida logicamente antes de ser perdoado e antes da ira de Deus ser satisfeita.

Mais um problema vem do difícil posicionamento da adoção na ordo calvinista. Será que deveríamos colocá-la no novo nascimento (regeneração)? Se colocarmos a adoção no novo nascimento, então também temos uma pessoa se tornando filho de Deus (o que eu acho que deve ser parte da regeneração) logicamente antes de ser perdoado e justificado.

E ainda outro problema vem do difícil posicionamento da santificação na ordo calvinista. Eu acho que a maioria dos calvinistas concordaria com o que tenho colocado aqui. Ainda assim, tenho ouvido (e lido) que muitos calvinistas afirmam que a regeneração é o começo da santificação. Se for esse o caso, então os calvinistas também precisam explicar como alguém pode ser santificado (feito santo) antes de ser justificado.

Também é difícil posicionar a união com Cristo na ordo calvinista. Quando nos tornamos unidos com Cristo? Não nos tornamos unidos a Cristo na regeneração, logicamente antes de uma resposta de fé? Isso levaria à conclusão de que se pode estar em união com Cristo logicamente antes de crer em Cristo. Se a união com Cristo na ordo for colocada após a regeneração e fé, então nos deparamos com o problema de pecadores receberem nova vida espiritual logicamente antes de serem ligados à fonte da vida - Cristo.

A ordo calvinista tem muito a prestar conta e parece ser irremediavelmente problemática. Ao colocar a regeneração antes da fé, a ordo salutis calvinista se envolve em inúmeros absurdos teológicos, enquanto a ordo arminiana evita-os todos.



Fonte: SEA

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Comentários

  1. Referente aos comentários sobre a ordo calvnista é muito simples.
    Regeneração, conversão e justificação acontecem simultaneamente.
    Aquele que foi regenerado será levado automaticamente à conversão e justificação, assim não pode haver um regenerado que não seja convertido ou justificado.
    Não existe um tempo de espera para essas ações acontecerem, visto que todas são efetuadas por Deus, isso é monergismo e independe da capacidade humana.
    A respeito da santificação, sim ela começa na regeneração em conjunto com o que foi dito anteriormente.A diferença é que essa é uma obra contínua, diária, quando as outras são imediatas e acontecem apenas uma vez.

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    Respostas
    1. Olá sr. "Escreveu"! A ordo salutis no que se refere a "conversão" é sempre uma construção lógica e não cronológica. Portanto, a crítica se refere a como o calvinismo concebe a sua ordo salutis em relação a Escritura. Nem todos os calvinistas colocam a justificação depois da regeneração, há calvinistas que a colocam depois.

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  2. Fico com uma pergunta.
    Na visão arminiana, se uma pessoa foi regenerada, e passou pelo processo de conversão e justificação, mas por algum motivo ela se afastou da fé (se desviou), será necessário passar por todo o processo novamente?
    Ps:Desculpe pelo nome de usuário, foi feito à muito tempo e tinha esquecido dele, só percebi depois que escrevi o comentário.

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    Respostas
    1. Olá sr. "Escreveu"! Há basicamente três visões sobre apostasia da fé entre arminianos, a saber:

      1) Há arminianos que creem na perseverança dos santos, são os chamados arminianos de 4 pontos. Assim sendo, para esses uma vez que o crente foi regenerado ele jamais apostatará da fé perseverando nela até a sua morte.

      2) Há arminianos que creem que a apostasia da fé é possível, porém irreversível. Assim sendo, para esses uma vez que o crente regenerado apostatou da fé ele jamais retornará a ela.

      3) Há arminianos que creem que a apostasia da fé é possível, porém reversível. Assim sendo, para esses uma vez que o crente regenerado apostatou da fé ele poderá retornar a ela.

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